Gay Talese no Brasil

Posted by Ricardo Cazarino | Posted on quarta-feira, julho 08, 2009

É atrás dessa frase cravada em um pequeno cartaz no centro no teatro do Museu de Arte de São Paulo, iluminado por canhões de luz, que centenas de pessoas lotaram as confortáveis poltronas de ponta a ponta. Alguns se expandiam para os espaços laterias e por lá ficavam. O amplo teatro no subterrâneo une equipamentos modernos como os aparelhos de tradução simultânea as rústicas paredes da construção. Mesmo com as portas já fechadas, uma fila ainda se contorcia e dava voltas no vão livre do Masp. Todos na esperança de ouvir algumas palavras do consagrado repórter do The New York Times, Gay Talese.

Para profissionais de comunicação, Gay Talese dispensa apresentações. Considerado a pai do “new journalism”, que utiliza técnicas descritivas do romance com a realismo das personagens, deu uma verdadeira aula de jornalismo para alunos, profissionais e amantes da literatura.

Aos 77 anos, entrou no palco ao som de palmas contínuas. Com andar calmo, exibiu seu terno alinhado, sapato bicolor e um olhar admirado diante da plateia. Sorriu. Repousou o chapéu sobre uma pequena bancada ao centro e prosseguiu o restante da noite com as pernas cruzadas e mãos levamente gesticulantes. Silêncio total. Olhos e ouvidos atentos. A palavra é dele. Voz doce, firme e precisa.

Com mais de 50 anos de carreira, fez um passeio por seus trabalhos e relembrou a primeira matéria que escreveu nas modernas máquinas de escrever da redação do NY Times na década de 30. Aos 19 anos, o então entusiasmado “faz tudo” do jornal não imaginava que sua curiosidade e percepção lhe trariam tantas glórias. Seu primeiro personagem: um letrista do jornal que tinha por função escrever as notas que passavam no letreiro luminoso ao lado externo do prédio. Para Gay Talese, o simples trabalho era a oportunidade perfeita. Mergulhou por algumas horas na vida do trabalhador, perguntou as curiosidades, fatos marcantes e começou assim a traçar o perfil do entrevistado. Pediu emprestado uma máquina, sentou e redigiu. Tal folha caiu nas mãos do editor que publicou a matéria. Ainda sem assinatura. Mas estava impressa.

Das batidas fortes e barulhentas das máquinas que mais pareciam caixas registradoras, aos teclados delicados de um computador, o estilo de Gay Talese não se perdeu, pelo contrário, ganhou mais características e força. Ganhou o respeito e admiração. “Nos meus trabalhos, sempre começo algo com a descrição de algum lugar, de alguma pessoa. Procuro transformar palavras em imagem. Como se o leitor estivesse vivendo o mesmo fato a medida que eu os vejo”, declara.

Em diversos pontos da palestra relembrou a essencia de um jornalista: revelar a verdade. “O bom jornalismo é feito de verdade tanto quanto se pode chegar perto dela”. Outra base importante para conseguir uma boa história está na educação, na cortesia do profissional, na capacidade dele em conquistar a confiança do entrevistado para que possa ir fundo, cercar os detalhes e redigir com entusiasmo.

Gay Talese tem um olhar diferente. Uma curiosidade, como gosta de dizer. Ao cobrir uma luta de boxe, preferiu desvendar a vida do juiz. Ao reportar uma final de jogo de baisebol, optou contar sobre os trabalhadores que cuidadam da grama. Até os pedintes de rua e uma enorme fila para comprar calças jeans não escapam ao seu olhar. O velho bloquinho e uma caneta são seus companheiros.

O jornalista ainda fez questão de dizer que sua visita ao Brasil, a convite da FLIP (Festa Literária de Paraty/RJ), que aconteceu na última semana, foi supreendente. Ficou emocionado ao presenciar uma enorme quantidade de pessoas em uma feira exclusiva de obras impressas. “Eventos como esse, com essa proporção, não acontecem em Nova York e nem em Washigton. Em nenhum outro lugar”. Cerca de duas horas depois, todos continuam atentos. Parecem não piscar. Ficariam por mais quantas horas fossem necessárias. É preciso encerrar. Mais aplausos.

Comments (9)

"Eventos como esse, com essa proporção, não acontecem em Nova York e nem em Washigton. Em nenhum outro lugar"

Isso é muito legal, ok, mas também vejo como uma ação antagônica. Em um país que nem se tem uma alfabetização decente... e lá é cara e há um grande cônchavo... sinceramente, não sou muito fã não...

abç
Pobre Esponja

Lá é caro: prelos, estadia

Pois é, construiu uma história tão lolvável e veio de tão longe para falar uma merda sem tamanho:

Homossexual Talese se declarou a favor da desobrigatoriedade do diploma para jornalistas exercerem a função.

Isto, mesmo sem saber patavinas das realidades das redações dos veículos de comunicação brasileiros.

Desculpe-me, mas não vou fazer coro às homenagens. E tenho dito.

Leo:Concordo em partes com vc. Mas não podemos deixar de lado a capacidade de Talese de transformar o texto jornalistico em algo mais agradável aos olhos numa época em que isso nem existia...daí sua merecida importância. De fato nao está atualizado as redações..mas são outros tempos. Seu legado, o olhar do observador permanece....

Adorei seu texto sobre Gay Talese! Parabéns!

Querido amigo avassalador...
O que mais gosto da blogosfera é encontrar informações e coisas que normalmente não conheço.. Por exemplo este icone do jornalismo era até hoje um desconhecido para mim...(que ignorancia!)... graças a voce, essa condição está corrigida!

E isso algumas semanas depois do diploma ter ido pro saco no exercício do jornalismo.

Gay Talese não é formado em jornalismo. Ele é especialista na profissão, mesmo assim, pretou-se a ceder um favor: minutos de seu conhecimento pra estudantes e outros profissionalecos da área.

Se todos concordam que precisam de exemplos, porque o prisma da educação foi deixado de lado pelo interesse do ego?

Bom, espero que o Brasil um dia encontrei o seu Gay Talese!

Belo texto, colega. Seu blog também é muito bom.

Abraço

Excelente. Esse post foi um presente!

Abs